novembro 20, 2007

Um Celular com Câmera

Pichação






Urubumóvel (nada a ver comigo)








Lagartão em Copacabana. Provavelmente caiu no mar nas Cagarras ou no Pão
de Açúcar










O Golfista da Praça Cuauhtemoc

Chama-se Rui. Foi fazer um exame no hospital e não o deixaram sair - puseram-lhe cinco safenas. Enquanto aguarda pelo dia em que poderá voltar a realment praticar exercícios, treina seu drive e seu putting na praça Cuauhtemoc. Tem que tomar cuidado com as crianças, porque as bolas são pesadas, e com os cachorros, que querem correr atrás delas. Já machucou dois e teve que pedir muitas desculpas.





novembro 19, 2007

A Propaganda é a Alma do Negócio

Subjetivismo Concretista embaixo da Rocinha

Indo pro motel saindo do Dois Irmãos
Da favela jogam uma pedra que pega no pára-brisa do carro
(E o estilhaça, não o quebra)

"Meu amor", digo eu, "você me enlouquece,
o mundo vira um quebra-cabeças, tudo me são
apenas pedaços de um todo incompleto.
Estou esquizofrênico".

"Meu amor", responde ela, "você me inspira.
Vejo o mundo com os olhos
de uma pintora cubista".

E quem olha de fora pensa
"O amor dele os enredou
como uma teia de aranha"

Os Videntes

Não é que os cegos não vejam
Eles vêem o futuro
O tempo todo

novembro 05, 2007

Morro de São Paulo

Confio na palavra tanto quanto numa lâmina afiada
Se o diabo atenta, ela entra


Poesia (boa) pichada na Vila, de Ângela Toledo.



O Jardim de Manequins

Oi, gente. Voltei agora de férias e estou fazendo uns frilas que me deixaram sem tempo pra vocês. Assim que selecionar as melhores entre as mais de 600 fotos que tirei em Morro de São Paulo (malditas memórias de câmeras digitais) e reduzi-las, postá-las-ei aqui. Pra vocês não reclamarem que os abandonei, um texto meu do começo dos anos 90, um projeto de curta. Como ainda se iniciavam os 90, tem uma cara tremenda de década de 80 e confesso que na época andava meio sem saber sobre o quê escrever exatamente. Parei de escrever contos porque sentia-os ficando muito técnicos, com narrativas fantásticas, mas sem substância, muito glacê e pouco conteúdo. Salvou-me escrever para teatro, que me realinhou com a objetividade, com o compromisso com a narrativa e o melodrama barato. Aí vai, portanto, O JARDIM DOS MANEQUINS

cena i

bar/noite

mônica/ rapaz/ marisa



uma moça - mÔnica - está sentada entediada olhando para o chope, para as pessoas e o cenário em geral. Num bar, claro. um sujeito - um garoto mal saído da adolescência, um pouco mais novo do que ela - se aproxima.

Sujeito: A gente nunca sabe o que fazer quando nos deixam sozinhos...

Mônica: (DISTRAÍDA) Como?

Sujeito: Ah, quando estamos conversando e se levantam pra ir ao banheiro... a gente nunca sabe o que fazer, no que pensar...

Mônica: Sexo.

Sujeito: Como?

Mônica: Quando eu fico sem assunto na cabeça, eu penso em sexo. É bom ter uma boa vida sexual pra isso. Pra arejar a cabeça.

Chega marisa do banheiro, pega a bolsa e se ajeita pra sair.

Marisa: Vamos nessa?

mônica aquiesce, termina de beber o chope e se levanta, vai saindo com marisa, mas antes passa a mão na cabeça do rapaz.

Mônica: Tenha uma boa vida sexual. Areja a cabeça e a gente não fica tão obcecada com sexo.

o gAROTO FICA OLHANDO UM POUCO ELAS SE AFASTAREM, SEM SABER COMO RESPONDER E FALA, ENTREDENTES.

Sujeito: Sapatão...

Vai se afastando. Uma voz o chama.O garoto vai na direção dela e sai de cena.

Voz: Thiago! Aí, cara! E aí, como é que vai a Ritinha?



cena ii

ruas/noite

mônica/marisa



as moças vão andando e sorrindo pelas ruas.

Marisa: Tu não vale nada, Mônica.

Mônica: Hoje não tô pra barbado. Muito menos pra imberbe.

Marisa: Hoje é a noite das mulheres.

Mônica: Hoje é noite de encher a cara, Marisa. Chega de me esconder, de ter que tomar cuidado com isso, com aquilo. Estou livre! (GRITA PELAS RUAS) Não namoro mais homem casado! Terminei tudo!

uma voz grita em resposta, dos prédios.

Voz: Vai arrumar alguém, então, porra!

As duas se olham e riem.

Marisa: Não adianta, tem sempre alguém policiando.

retomam a caminhada. passam em frente a uma boutique. Mônica pára e fica olhando. Marisa, que continuou andando até o carro, a vê e volta.

Marisa: Já se apaixonou de novo?

corte. aparecem os manequins e o soturno interior da loja.

Mônica: Quando a gente se conheceu, o Marcelo vivia me dando presente...

Marisa: Umas roupas dessa?

Mônica: Porra nenhuma, ele achava feio. Ficava me dando uns vestidos lindos, mas que eu vou conseguir usar uma vez por ano. Depois não deu mais nada.

Marisa: Claro. Passou a ser a vez de você dar.

Mônica: Sabe que eu sempre quis ter o corpo desses bonecos?

Marisa: (SURPRESA) Pra quê?

Mônica: Ah, ó só... tudo firme, olha as pernas, tudo certinho... e tão sempre elegantes. E, porra, tão sempre bem vestidos. Melhor do que eu.

Marisa: Gostou dos vestidos, hem?

Mônica: Ah, tô com saudade de botar umas roupinhas assim e sair pra matar... aquele ali, como é que você acha que eu ia ficar nele?

marisa olha para um lado e para o outro, morde o lábio inferior.

Marisa: Vamos ver, então, porra!

marisa se abaixa e começa a mexer no cadeado que fecha a porta de vidro. Mônica observa surpresa a amiga, olha para os lados assustada, tenta se esconder sob a marquise.

Mônica: Você ficou maluca, Marisa? Que que você tá fazendo?

Marisa: Abrindo a porta.

Mônica: E desde quando você é arrombadora?

Marisa: Quando eu tinha dezesseis anos, namorei um garoto que abria carro. Só pra gente dar uma voltinha, depois largava. Pela emoção. E ele me ensinou a abrir fechadura.

Mônica: E você não ficava com medo?

Marisa: Ficava era com tesão! Transei em tudo que era tipo de carro com ele! Fiquei até expert nessas coisas (CONSEGUE ABRIR O CADEADO. EMPURRA A PORTA). Vamos entrar?

Mônica: "Publicitária e arquiteta presas por arrombamento e furto..."

Marisa: Sabe o que aconteceu com aquele meu namorado?

Mônica: O quê? Virou um traficante rico e famoso?

Marisa: Um advogado rico e famoso. (ENTRA)

mônica olha para um lado e para o outro, assustada.

Mônica: Ah, droga, eu mereço parecer bonita! (ENTRA)



cena iii

loja/noite

mônica/Marisa/assaltante



a loja parece bem maior por dentro. a luz vem toda da rua e de algumas fracas luminárias em cima. os manequins estão dispostos de uma maneira quase lúgubre, alguns pela metade, outros semi-vestidos.

Mônica: (PROCURANDO MARISA) Marisa... Marisa...

uma silhueta surge por trás dela, saindo das sombras, a cabeça envolta num véu, sem que ela perceba.

Marisa: (ABRINDO OS BRAÇOS E ENVOLVENDO A CABEÇA DE MÔNICA COM O VÉU) Experimenta este véu de escuridão!

Mônica: (ASSUSTADA) Aaaaaahhhh!

Marisa: Quieta, Mônica. Vai acordar a vizinhança toda!

os manequins observam mudos.

Mônica: Eles nem se mexem.

Marisa: (SENTANDO-SE SOBRE O COLO DE UM MANEQUIM) E você queria ser sexy que nem eles...

Mônica: Elegante, Marisa. Elegante. (DESPE UM MANEQUIM E EXPERIMENTA A ROUPA QUE ELE USAVA) E bonita.

Marisa: Você é bonita...

Mônica: Nosso conceito de beleza é diferente do de homem...

Marisa: "Vai narrar pelo mundo os meus tormentos:/ De almas estóicas a dureza louca/ Rirá dos teus lamentos/ Mas nos servos de Amor terás abrigo:/ Quando te ouvirem, chorarão contigo." Bocage.

Mônica: Bonito. Mas você não ia achar bonita a mesma mulher que ele.

Marisa: Que me importa a opinião dele? (GIRA A CABEÇA DE UM MANEQUIM EM SUA DIREÇÃO) Ele está morto e enterrado.

Mônica: E a gente, hem, Marisa? (EXPERIMENTANDO UMA BLUSA) Você acha que essa aqui tá boa preu ir presa?

Marisa: (APROXIMANDO-SE DELA, PERFIS LADO A LADO) Qual o problema? Sem dinheiro pra comprar roupas e sem ninguém que as dê de presente...

Mônica: É... (PEGA UMA BERMUDA. TIRA A CALÇA E COMEÇA A EXPERIMENTÁ-LA) Quando eu não trabalhava eu podia culpar meus pais por não ter dinheiro pra comprar essas roupas...

Marisa: Quando eu não trabalhava eu achava que nunca ia precisar trabalhar. (APÓIA-SE NUM MANEQUIM)

Mônica: Tinha um eterno pretendente rico?

Marisa: Não. Esse é um dos meus traumas. (PEGA UM DOS BONECOS) Eu era bonita e simpática. Os eternos pretendentes ricos tinham medo de mim. Todas as minhas amigas tinham um.

Mônica: E você ficou traumatizada com isso?

Marisa: Se não fossem os carros do Marcelo, ficaria mais. (TOCA AS MÃOS DE UM DOS BONECOS) "Marisa... em meu coração ardem chamas de revolta. O fogo da paixão abafa-se frente a seu calor. (DECLAMA PARA A AUDIÊNCIA MUDA DOS MANEQUINS) A fúria do desejo se envergonha frente à sua intensidade. E bate ele em meu tronco com força cada vez maior. Injusta é a força que o separou do seu" (ABRAÇA UM MANEQUIM) Ninguém nunca me disse isso.

Mônica: Nem a mim.

Marisa: E nem sentiu. Aí eu ficava escrevendo as coisas que esperava que dissessem. Daí achava que ia ser poeta e nunca ia trabalhar.

Mônica: Slogans não deixam de ser poesia.

Marisa: Mas trabalhar todo dia não deixa de ser trabalho. (DESPE UM DOS MANEQUINS, VESTE-SE COM A ROUPA DELE. EXAMINA O MANEQUIM) E se você tivesse esse corpo, afinal, ia trabalhar?

Mônica: Não sei. Se eu tivesse esse corpo, seria outra pessoa...

marisa vai até o interruptor e fica brincando com ele, acendendo e apagando, imitando flashes espoucando em cima dos manequins.

Marisa: Os homens perderiam a cabeça por você... os flashes espoucariam onde quer que você fosse... seu lar seria o mundo.

Mônica: E me pagariam pra usar essas roupas...

Marisa: (GIRA, MOSTRANDO CASACO QUE EXPERIMENTA) E dessa, o que diz? Sou uma mulher perfeita, agora?

Mônica: Alucinante... Faça uma mulher feliz: vista-a bem. Por que nos cobrindo nos sentimos melhores?

Marisa: Ó a mulher... fica deprimida, começa logo a querer ficar profunda... (ABRE UMA GAVETA) Ih! Vê só o que achei!

mônica continua trocando de roupa, observada pelos manequins, enquanto marisa vem caminhando em sua direção.

Mônica: O que foi?

Marisa: Poesias... "Alto; sobretudo, forte./ Faz noite em minha boca/ E as palavras se dissolvem em meu corpo/ Alto; sobretudo forte/ Faz escuridão em torno de nós/ E a linguagem escorre, afrodisíaca/ Pela garganta".

Mônica: Erótica.

Marisa: Vê se um homem vai querer se prestar a isso...

Mônica: "Descuidado; sobretudo apressado/ Sem imaginação, acende a luz/ Marcelo vai passando em minha vida".

Marisa: Deixa a poeta quieta, Mônica. Também já tive essa minha fase. Amores de papel.

Mônica: Logo você que eu sempre achei tão saidinha...

Marisa: Sempre fui muito crédula, Mônica. E quem acredita em alguma coisa, qualquer coisa, é sempre saidinha.

Mônica: A fé remove montanhas...

Marisa: Já foram tiradas todas, Mônica. Agora grandes são os desertos, minha alma, grandes são os desertos. (OLHA AS POESIAS) Vendendo essas roupas todos os dias... mulheres se embelezando para suas paixões... mulheres se reconstruindo na fossa... vestidas por poesias de sonhadoras...

Mônica: (AOS MANEQUINS) E muda, a assistência desfila magra e sedutora...

Marisa: E seus corpos perfeitos... também, não bebem, não fumam, não amam e não trepam...

Mônica: Um emprego e tanto. Beleza 24 horas por dia.

Marisa: As modas passam... e eles ficam.

Mônica: Mas não têm ninguém... por que que iriam se preocupar? Ó só essas pernas... vê as minhas... (SEGURA AS PERNAS DO MANEQUIM) tem gente que acha finas, outros acham grossas, uns dizem que sou leve, outros que sou muito terra... as pernas deles são as pernas deles. Ó os braços. Vê os meus. Dizia o Marcelo que tanto o apertavam... tanto o queriam para eles...

marisa pega uma jaqueta de um dos manequins e sai dançando pela loja.

Marisa: "All of me... why not take all of me... can't you see... I'm no good without you... take my lips... I want to lose them... take my arms... I never use them..."

Marisa continua dançanndo e cantando pela loja. mônica suspira abraçada a um manequim. murmura.

Mônica: ... Marcelo...

olha para o lado e, ao ver o manequim olhando para ela, vira-lhe o rosto. marisa pára de cantar. vai para próximo da amiga.

Marisa: Esquece, Mônica. Esta noite estamos ricas. Vamos nos alegrar fazendo todas as compras que queremos...

mônica olha para as roupas no chão.

Mônica: Não gostei de nenhuma dessas roupas... (OLHA OS MANEQUINS) Não gostei desses manequins... não gostei do garoto no bar... eu sinto falta do Marcelo...

marisa, que observava piedosa, abraça a amiga, que começa a chorar.

Mônica: Sempre falei tanto do Marcelo com aquele lenga-lenga da esposa e eu aqui não sei nem decidir que roupa levar...

Marisa: Se as pessoas realmente soubessem o que querem, Mônica, minha profissão não ia existir...

por sobre as imagens dos manequins imóveis, o som de passos. de alguém mexendo na fechadura. as duas meninas olham para a porta assustadas e vêem uma sombra mexendo na fechadura e entrando. com uma arma em punho. correm para o provador para se esconderem. o assaltante vai derrubando os manequins, espalhando as roupas. passa bem perto delas, que se encolhem assustadas dentro da cabine de provas. o assaltante vê as poesias da vendedora e as joga fora. Remexe mais nas gavetas. encontra corações flechados desenhados. também joga fora. por último, vê dinheiro. de sua sombra, vê-se apenas o brilho do sorriso. ele embolsa o dinheiro e vai embora. as amigas, assustadas, depois que ele saiu, também saem do provador e fogem.



cena iv

ruas/noite

mônica/marisa/passantes



na calçada, fora da loja, as amigas olham-se uma para a outra e sorriem. começam a rir. gargalham desbragadamente e sentam-se no meio-fio.

Mônica: Por que que só a gente podia estar na fossa hoje?

Marisa: Homem prefere ir logo direto à questão...

Mônica: E acabou que a gente não trouxe nenhuma roupa. Nem de lembrancinha...

enquanto elas falam, ouve-se ao fundo o alarme da loja e vozes gritando ao longe "pega ladrão, pega ladrão", depois sirenes e sons de tiros.

Mônica: Ah, Marisa... valeu, amiga. Tô me sentindo melhor (ABRAÇA-A)

Marisa: O que eu te falei, Mônica... nada como uma visita a uma boa boutique pra animar uma garota...

a câmera vai fazendo zoom-out. as duas amigas riem no meio-fio. continua o som de tiros. pessoas passam correndo, algumas de pijama, curiosas para saberem o que está acontecendo. passa um carro de polícia.

Marisa: Olha que pessoal exagerado...

Mônica: Sabe de uma coisa, Marisa? Você precisa me ensinar a arrombar fechaduras...

fade-out. fim.